No encontro, discutimos o artigo de Rafael Lopes de Almeida, “Entre a história antiga e o seu presente etnográfico”, que propõe uma abordagem de longa duração inspirada em Fernand Braudel. O autor analisa a produção de cerâmica policroma no médio Solimões, articulando-a com documentos históricos, especialmente relatos de viajantes desde o século XVI até o século XX. A metodologia adotada consiste em ler as fontes arqueológicas à luz das fontes históricas, contribuindo para um movimento recente na arqueologia amazônica que rompe com a visão de arcaísmo, revisitando relatos antes desacreditados, mas que indicam a existência de sociedades densas e complexas na região.
Durante a discussão, abordamos como o tratamento das fontes e os recortes de pesquisa se modificam conforme a disciplina que orienta o diálogo interdisciplinar. Esse desafio se torna ainda mais evidente em trabalhos coletivos, que reúnem diferentes perspectivas. Retomamos debates anteriores, como o da produção de farinha: no médio Solimões, parece ter sido uma prática indígena pré-colonial, embora o consumo generalizado desse alimento no contexto amazônico só tenha ocorrido após a chegada dos europeus. Discutimos também as dificuldades de mapear redes de trocas pré-coloniais, especialmente no caso da cerâmica policroma, cuja produção acontecia em diversos locais simultaneamente, tornando sua circulação mais complexa de rastrear.
Por fim, o debate se expandiu para os modos de ocupação e suas transformações do período pré-colonial ao colonial, ressaltando a importância de ampliar as fontes além dos relatos de viagem, incorporando documentos administrativos e análises arqueológicas de espaços como roçados, aldeias, cemitérios e áreas de produção. Além da mandioca e do manejo florestal, destacou-se a relevância de investigar outros sistemas de manejo, como o das tartarugas e a produção de manteiga, práticas que, segundo Rafael Lopes, refletem um manejo indígena de longa duração. A conclusão aponta que a articulação entre história, arqueologia e etnologia permite refletir sobre as continuidades e transformações nas práticas de manejo, ocupação e circulação de saberes e objetos, abrindo campo fértil para pesquisas capazes de aprofundar o entendimento das relações entre sociedade, ambiente e história na região.